domingo, 18 de março de 2018

Em nome do Pai!

O “olha que eu digo ao teu pai e ele diz-tas” foi condensando, por demasiado tempo, um modelo de parentalidade (e de relação entre homens e mulheres e entre estes e as crianças) mais ou menos clivado: a mãe protegia, cuidava e dava colo. O pai punha o pão na mesa e era o rosto da Lei e da ordem familiar. A mãe era dócil, afetuosa e tinha um colo do tamanho do mundo. O pai era duro, distante e nunca se comovia. Afinal, “homem que é homem não chora” e emoções, se as tinha, era sua obrigação escondê-las atrás de um ar grave e sisudo.
  A Psicologia e a Psicanálise Clássicas abriram avenidas na compreensão das relações humanas, da parentalidade e das relações familiares. Mas, por mais que, em tantos e tantos aspetos, tenham estado à frente do seu tempo (dando um empurrão ao mundo criativo que pula e avança), não deixaram (inevitavelmente!) de também beber influências de uma ideia clivada de família, organizada em torno de um “polícia bom” que protegia e cuidava, e de um “polícia mau” e distante que garantia a Lei. Talvez por isso, o pai foi sendo conceptualizado como o terceiro, que abria a relação (mais ou menos fusional) mãe-filho à diferença e à realidade. Não sendo avanço pequeno na ciência nem função pouco importante a do pai, não deixava, ainda assim, de secundarizar o seu papel no desabrochar das extraordinárias competências do bebé…
Mas, num mundo que pula e avança, há muito que vários modelos da Psicologia e da Psicanálise Contemporâneas (com conceitos como o de “tríade originária” de Chbani e Perez-Sanchez, por exemplo) me parecem sugerir que modelos integrados de família (e de sociedade) são mais amigos da saúde e do crescimento.

  Num mundo que pula e avança, felizmente as mulheres conquistaram as universidades e o mundo do trabalho e exigem (exigimos todos!!!) a justíssima igualdade de direitos. Num mundo que pula e avança, felizmente, os homens exigem o direito de cuidar, de se comoverem e de serem sensíveis, próximos e afetuosos (lembrando, aos mais distraídos, que o seu coração também bate do lado esquerdo, ou que a condição masculina não é sinónimo de menos competências parentais). Neste contexto (como em muitos outros), menos clivagem significará mais saúde. Nesta lógica, tal como o colo, o mimo e a abertura à diferença e à realidade deve ser a multiplicar por cada um dos pais, também a Lei Familiar deverá – parece-me - resultar de um consenso mínimo entre eles, tendo, evidentemente, os dois a obrigação de a fazer aplicar.

  A ser assim, quanto mais acarinharmos e integrarmos a diferença, com a consciência de que todos temos um coração a bater do lado esquerdo, mais inclusiva, integradora e amiga da saúde e do crescimento será a família (na sua composição "tradicional" ou nas “novas” composições que resultam do crescente  e indispensável (!) respeito pelas escolhas das pessoas).