Sempre
foi bom a Física e a Matemática (ainda que a História nunca tivesse deixado de
ser uma espécie de paixão platónica). Nos anos do Curso, numa área de
interseção entre a Engenharia e as Novas Tecnologias (o sonho de qualquer mãe,
portanto), foi conseguindo conciliar algoritmos com noitadas a saltitar entre o
Bairro Alto e o Cais do Sodré. “Bebia-se muito. E estava-se bem. Quer dizer…”. O
Pedro sentia, na altura como hoje, uma ansiedade de fundo, ora mais miudinha
ora mais ruidosa, mas sempre à espreita. À boa maneira da canção do António
Variações, só parecia estar bem onde não estava, saltitando de bar em bar, à
procura sabe-se lá do quê. Acabava por não se divertir tanto assim. Estava
sempre em grupo, como se precisasse disso para se perder nos seus pensamentos e
inseguranças. Bebia. Bebia muito. Não tanto por prazer. Menos ainda para
celebrar a alegria de estarem juntos. Na verdade, tanta vodka, parecia não ser
muito mais do que uma forma de calar uma ansiedade difusa, mas omnipresente, ao
mesmo tempo que lhe dava a desinibição que precisava para se aproximar das
turistas nórdicas. Turistas, sempre turistas. Ou, quando muito, estudantes Erasmus.
Desde que a Maria, no 3º ano de Faculdade, o deixou de coração partido, não
mais se permitiu aproximar de ninguém que pudesse percorrer as ruas da mesma
cidade no mês seguinte.
Com
o fim do curso, uma oportunidade de emprego trouxe-o de volta à cidade que o
viu crescer. Deixou para trás as noitadas de estudo no Técnico e as
deambulações desenfreadas no Bairro Alto. O trabalho intenso fazia, agora, as
vezes da Faculdade. Os bares novos as vezes dos velhos. Mas faltava dimensão (e
disponibilidade) ao grupo, que isto de se terem reuniões importantes logo pela
manhã tem que se lhe diga. A ansiedade, essa parecia ser cada vez menos
miudinha. Teimava, agora, em impor-se de rompante nas situações mais
inconvenientes, acelerando a respiração e fazendo o coração querer saltar pela
boca.
Talvez,
às vezes, façamos todos um bocadinho de Pedro. Talvez, às vezes, as pessoas
sejam todas um bocadinho especialistas em (de fuga para a frente em fuga para a
frente) tentar camuflar a angústia. Mas se isso até pode, numa ou noutra
circunstância muito particular, ser útil num primeiro momento, tenho para mim que, quando cristaliza
em movimentos mais enquistados, deixa as pessoas mais distantes dos seus
recursos saudáveis e, por isso, mais sozinhas e com menos armas para fazerem
face a uma angústia crescente. Talvez seja só quando as pessoas se começam a
reencontrar com as histórias e as pessoas que moram bem dentro da sua história,
ao mesmo tempo que puxam para si quem lhes faz bem, que a esperança e a
vitalidade ganham (verdadeira e decisivamente) o protagonismo à angústia e ao desamparo.
*Título
inspirado na música do António Variações
Nota: Atendendo ao profundo respeito pela intimidade das
pessoas que me dão o privilégio de guardar as suas histórias e aos princípios
deontológicos a que estou vinculado (de sigilo, nomeadamente), como não poderia
deixar de ser, este, como todos os textos do blogue - sendo, por vezes,
inspirado num ou noutro aspeto de histórias reais - está muito longe de
corresponder a uma descrição literal.