domingo, 17 de novembro de 2019

O Amor. É sempre o Amor!


  Uma pianista muito talentosa, idolatrada pelo público e pela crítica, preparava-se para iniciar um concerto numa carismática sala de espetáculos. Aclamada efusivamente mal pisa o palco, senta-se ao piano e procura, na plateia, o companheiro, como que para se sossegar no seu olhar. Mas não encontrou mais do que uma cadeira vazia. E, ato contínuo, as mãos começam a tremer-lhe e os suores frios tomam-lhe todo o corpo. Até que, ao ver o companheiro (ainda que atrasado) tomar o seu lugar, se volta a sentir a talentosa e confiante pianista, pronta a comover plateias. Lembrei-me desta cena de filme quando, ao ouvir um trecho de uma entrevista do Cristiano Ronaldo, ele dizia, a propósito da perda do pai, que o que mais lhe custava era o pai não ter podido ver onde chegara, como que dando a entender que só vale a pena ser o melhor do mundo quando se tem para quem.

  Talvez seja sempre assim. Talvez não haja como (como aprendemos com os psicanalistas das relações de objeto ou com os teóricos da vinculação, por exemplo) imaginar o ser humano à margem da sua rede de relações significativas (as reais e as que guarda, no mais fundo de si). Talvez seja quando, da síntese desta matriz relacional, resulta mais indiferença e solidão do que afeto e vida, que a busca do “amor do objeto” se traveste de violência e maldade. Na ilusão de que, à falta de outros trunfos, a intimidação, a violência ou a manipulação - que mais não fazem do que aprofundar, mais e mais, o fosso do deserto relacional - possam aproximar o outro. Ou não fossem os gestos de afeto a única forma de tornar o outro verdadeiramente aproximável.