Fui-me habituando a estudar em alguns artigos e manuais, primeiro, e a
ver com a ponta dos dedos mais tarde, na minha vida quotidiana e,
principalmente, no meu trabalho clínico que parece haver uma espécie de
dinâmica interna que nos ajuda a amortecer os choques do mundo exterior e nos
instiga a fazermo-nos à vida, mesmo nas circunstâncias mais adversas.
A este processo foi-se chamando, em algumas
circunstâncias, resiliência. Fui-o imaginando como uma espécie de almofada que
condensa a memória de todos os aqueles momentos ímpares em que nos sentimos
rigorosamente no mesmo comprimento de onda de alguém, numa lógica de: “com
abraços firmes como este para me abrigar a cada tempestade, podem chover
picaretas que ninguém me pára!” Esta espécie de certeza interior
inquebrantável, que nos instiga a mover montanhas e a enfrentar dragões, é
fundamental!
Neste contexto, talvez faça sentido pôr uma tónica
especial no discurso do empreendedorismo. Afinal de contas, em nenhuma
circunstância, as pessoas deixam de ser corresponsáveis pelo seu percurso de
vida. Mas, ao contrário do que um certo discurso às vezes parece querer dar a
entender, o “fazer-se à vida”, sendo essencial, pode não ser suficiente para as
coisas correrem bem. Quando abusamos da narrativa do empreendedorismo, talvez
estejamos, todos, a construir um discurso excessivamente culpabilizante, muito
pouco promotor da saúde mental e, paradoxalmente, muito pouco amigo do empreendedorismo,
ferindo-o de morte, por overdose.
É,
evidentemente, essencial “bater punho”, com alma e engenho, para ter sucesso.
Mas, não creio que a fórmula simplista: “se não consegues emprego/sucesso é
porque não tentas suficientemente” (que, no limite, poderá decorrer de certos
discursos mais ou menos fundamentalistas), ao colocar o alfa e o ómega da
responsabilidade exclusivamente no individuo, promova o empreendedorismo seja
de quem for. E, mais importante: talvez esteja muito longe de se sintonizar com
a humanidade das pessoas… a maneira mais efetiva (se não a única) de puxar
verdadeiramente pelas suas competências.
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