quinta-feira, 30 de julho de 2015

Violências



Capas de jornal. Aberturas de noticiários televisivos. 
Foi assim, durante dias, há um par de meses: a mediatização de casos de natureza, contexto e gravidade diferentes, mas com um padrão que os liga: a violência.
Nunca, em contexto profissional, conheci ninguém com comportamentos reiteradamente violentos (sejam crianças, adolescentes ou adultos) que não tivesse uma história marcada por um sofrimento muito significativo. Nunca. 
Uns, tão habituados a um registo omnipotente, quais principezinhos do quero-logo-acontece, que nunca tinham aprendido (por falta de sinais claros e consistentes de STOP ou de quem os tivesse ajudado a configurar a dor da frustração) a expressar de modo adequado a dor aguda da “derrota”. Quando ela, mais tarde ou mais cedo, acontece, a violência impulsiva surgia assim como uma resposta mais ou menos inevitável.
Outros que, sentindo-se quase invisíveis de tão pequeninos se sentirem, nas mais variadas circunstâncias (por acumularem experiências repetidas de amesquinhamento e humilhação, por exemplo), apanhavam a boleia protetora do grupo ou de qualquer outra capa de poder para, através da violência sobre os mais frágeis se sentirem, nem que fosse por breves momentos, os todo-poderosos (talvez seja isso que acontece com alguns grupos de delinquentes que se mascaram de adeptos de futebol, com alguns abusos violentos em algumas praxes académicas, com alguns casos de bullying ou com um ou outro caso de violência policial perfeitamente injustificada). 
Outros, ainda, bem ao jeito do Fight Club, pareciam sentir-se tão zombies (quantas vezes com história de episódios repetidos como vítimas de violência) que (à falta da liberdade interior de verem o coração bater mais forte com um pôr do sol em Santorini, um filme, uma música, um olhar ou um abraço) a dor dos murros e pontapés que dão e levam parece ser das poucas coisas que lhes liberta adrenalina nas veias, fazendo-os sentir um bocadinho menos adormentados, um bocadinho mais vivos, paradoxalmente.

Estou, com isto, a querer desculpabilizar este tipo de comportamentos? De modo nenhum. As regras parentais, as normas sociais e os regulamentos legais - assim como as consequências (firmes, coerentes e proporcionais) que devem decorrer da sua violação - são essenciais para proteger aqueles que estão numa posição mais frágil e para parar quem não parece conseguir gerir minimamente a sua agressividade. 
Sendo a perspetiva punitiva essencial, talvez já não faça é muito sentido dividirmos o mundo rigorosamente a meio: bons para um lado, maus para outro. Tendo a violência uma dimensão muito significativa de responsabilidade individual à qual ninguém deve poder fugir, a verdade é que parecem haver condições ambientais (a qualidade dos cuidados parentais em primeiro lugar, claro está, mas também a aposta clara em saúde mental, ou as oportunidades para educar a expressão emocional – pelo brincar livre, pela expressão artística e corporal, pela rivalidade dentro de um quadro de regras claras, que muitos desportos proporcionam, etc, etc.) que a podem tornar bem menos provável.

Perdoem-me a “lamechice”, mas não resisto a citar, a este respeito, o Nélson Mandela (ele que sendo, com inteiríssima justiça, um dos símbolos maiores do melhor que a humanidade alguma vez foi capaz de fazer, não deixou, durante um curto período do início do seu percurso público, de ser um defensor da violência feroz como arma contra violências maiores): “Para odiar, as pessoas precisam aprender, e se podem aprender a odiar, elas podem ser ensinadas a amar”.

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